Por CBTM
Um dia após o secretário de Programas do Tribunal de Contas da União (TCU), Carlos Sampaio, afirmar que, "se o Brasil quiser ser uma potência olímpica, terá de repensar suas políticas" e que "não há investimento científico nem sistema nacional para detectar talentos", o Ministério do esporte se defendeu, argumentando que investe nos programas "Descoberta do Talento" e "Núcleo de esporte de Base". E garante que fiscaliza com rigor o programa Bolsa- atleta. O ministério recorre a um trecho do parecer do próprio tribunal, que reconhece a "preocupação do Ministério do esporte em atacar problemas diagnosticados pela fiscalização do TCU". (Clique aqui para ver a foto ampliada) Procurado através de sua assessoria de imprensa, o presidente da Confederação Brasileira de vôlei (CBV), Ary Graça, foi outro que não quis comentar o parecer do TCU. A CBV, que desde 1991 conta com patrocínio estatal do Banco do Brasil, é uma das entidades mais beneficiadas pelos recursos do Ministério do esporte. Somente este ano, serão R$3 milhões garantidos através da Lei Piva, além de mais R$2.528.033,72, liberados através de nota de empenho divulgada este mês no Diário Oficial da União.
Questionados sobre o tema, o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e algumas confederações optaram pelo silêncio. Embora seja, disparado, o maior beneficiário dos recursos provenientes do Ministério do esporte, o COB, que vai receber e distribuir pelas confederações R$130 milhões da Lei Piva, referentes ao ano passado, não quis comentar o parecer do TCU, alegando não ter tido acesso ao conteúdo. Deste montante, R$40 milhões são administrados pelo comitê apenas para manutenção da entidade, envio de delegações a eventos e desenvolvimento do esporte.
- Não tivemos acesso ao parecer do TCU. Por isso, não há ainda o que declarar. Só lemos as reportagens, mas não o parecer do tribunal - afirmou o superintendente técnico do COB, Marcus Vinícius Freire.
O mesmo desconhecimento sobre o parecer também serviu de justificativa para o presidente da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos, Coaracy Nunes, silenciar sobre o tema ontem. A CBDA - outra entidade que conta com patrocínio estatal, dos Correios - também vai receber R$3 milhões pela Lei Piva e foi beneficiada nas notas de empenho divulgadas pelo Ministério dos esportes no D.O.U. Serão R$1.378.985,68 este ano para compra de equipamentos.
Gesta fala em desperdício
Mesmo sem também ter lido o parecer, o presidente da Confederação Brasileira de Judô (CBJ), Paulo Wanderley, não se esquivou da polêmica:
- Todos os projetos do alto rendimento e da base foram aprovados pelo ministério. A única crítica seria aos entraves burocráticos para a aprovação - disse Wanderley, cuja entidade também está na lista das mais beneficiadas pela Lei Piva (R$3 milhões em 2011) e garantiu uma nota de empenho de R$2.621.654,40, para compra de equipamentos.
Já para Roberto Gesta, presidente da Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt), outra confederação a receber a verba máxima da Lei Piva (R$3 milhões), não há o que reclamar do Ministério:
- Há uma boa vontade muito grande do ministério para discutir as políticas esportivas. Mas às vezes, desperdiçamos muitos recursos porque cada um faz algo diferente.
Diretor executivo da Confederação Brasileira de basquete, Luís Felipe Monteiro de Barros não se surpreendeu com as informações do TCU.
- Não seriam necessárias críticas do TCU para se saber isso. O fato de que deve ser criada uma política nacional para o setor, aproveitando-se os grandes eventos que irão acontecer no país, é um assunto discutido pelo próprio Ministério do esporte e pela comunidade - afirma. - As áreas social, educacional e esportiva têm de se reunir para traçar a política nacional de esportes, levando em consideração cada região e as escolas. É preciso discutir onde o esporte complementa as outras políticas públicas e vice-versa.
'APLAUDO DE PÉ A ATITUDE DO TCU'
Um dos poucos dirigentes a já terem criticado o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e a forma como este distribui os recursos da Lei Agnelo/Piva, o presidente da Confederação Brasileira de Tênis de Mesa, Alaor Azevedo, elogiou a atitude do Tribunal de Contas da União (TCU), que fez críticas à forma como os recursos são repartidos no esporte.
Claudio Nogueira
Como analisa as críticas do TCU à falta de uma política nacional de esportes?
ALAOR AZEVEDO: Eu já havia preparado uma representação a ser enviada ao Tribunal de Contas da União (TCU), pedindo o cumprimento da Lei Pelé, que cria um Plano Nacional de Esportes. O Conselho Nacional de Esportes foi criado há dois anos, com toda pompa e circunstância, mas não funciona. Consta da Lei Pelé, datada de 1998. Uma das funções do Conselho seria a de oferecer subsídios técnicos para a elaboração do Plano Nacional de Esportes e propor prioridades para a aplicação de recursos pelo Ministério do Esporte. Como não há o Plano, o casuísmo é permanente e há total falta de critérios na distribuição de recursos. Pensei em enviar esta representação, mas um advogado cobrou caro, e a confederação não tem verba.
Ficou surpreso com o TCU?
ALAOR: Surpreso, não. Aplaudo de pé a atitude do TCU. Além do Ministério do Esporte, a Secretaria de Comunicação Social da Presidência erra porque tem de fazer um plano que engloba o patrocínio (das estatais). Há falhas no ministério e na secretaria. Por isso, oito modalidades levam 90% do dinheiro (público) do esporte. As outras levam o resto. Até há quatro meses era assim, quando a Petrobras entrou (no taekwondo, remo, esgrima, boxe e levantamento de peso).
Acredita que as críticas vão repercutir junto ao Comitê Olímpico Brasileiro e ao ministério?
AZEVEDO: Creio que o COB e o ministério vão ouvir o TCU. Se fôssemos um país na normalidade, a liberação de recursos estaria inválida, pois não há um Plano Nacional de Esportes para regulamentá-la. O TCU reconheceu a total falta de critérios para distribuir recursos. Há confederações vivendo na China, e as que não têm nada, em Serra Leoa. Daí, a expressão “ChiLeoa”. Algumas modalidades crescem, e outras estão na Idade da Pedra. A injustiça social do país se repete na educação, na saúde e no esporte. Deveria haver outro órgão, que não o ministério, distribuindo recursos. O ministério tem de elaborar políticas, e não distribuir dinheiro. Agora, o ministério será obrigado a apresentar um plano à sociedade.
Qual proposta apresentaria?
AZEVEDO: A Lei poderia dar, no mínimo, R$2 milhões a cada confederação. O restante seria repassado a elas, levando em conta os resultados. Vi que no futebol italiano, 40% dos recursos são divididos igualmente entre todos os clubes. Dos 60% restantes, 30% são distribuídos por critério técnico, para o campeão, vice, etc. Sobram 30%, repassados pelo critério de público. Algo semelhante poderia ser feito na Lei Agnelo/Piva.