Por CBTM
O time do coração. Você já ouviu esta expressão de algum torcedor ao se referir à equipe de futebol preferida. No caso do bancário aposentado Laerte Rodela, 57 anos, corintiano roxo, a expressão bem que poderia ser adaptada para "o time de dois corações".
Isto porque Laerte vive há quase 16 anos, literalmente, com dois corações batendo em seu peito em sua cidade natal, Garça (70 quilômetros de Bauru).
No próximo dia 5 de abril, o aposentado completará exatos 16 anos em que passou por uma cirurgia de alto risco, quando recebeu uma segunda unidade do órgão vital.
Laerte Rodela é um dos dez pacientes que passaram pelo chamado transplante heterotópico em todo o Brasil.
Ele tinha 35 anos e trabalhava como bancário quando sofreu um infarto e passou por um cateterismo. "Eu comecei a caminhar, fazer exercícios, mudei a alimentação e depois de quatro anos precisei fazer uma ponte de safena em Marília, em 1987", relembra o bancário aposentado.
Após o operação, Laerte ficou debilitado e suas chances de sobreviver eram muito reduzidas.
--- O meu médico de Marília informou que o único meio de sobreviver é ir para São Paulo e procurar um transplante por lá. Foi o que eu fiz --- relembra.
Em 1992, o estado de saúde do bancário se agravou. Laerte se aposentou do banco e mudou-se para um apartamento em São Paulo, por alguns meses, para tentar conseguir o transplante no Hospital Beneficência Portuguesa.
--- Foi quando eu achei a equipe do doutor José Pedro da Silva, em São Paulo. A indicação era para um transplante e eu consegui fazer no dia 5 de abril de 1993", explica.
A cirurgia durou cerca de 11 horas e foi feita por uma equipe médica comandada pelo cirurgião cardiovascular. Porém, quando o aposentado se recuperou da cirurgia, teve uma surpresa inesperada.
--- Somente depois que eu acordei, fiquei sabendo que estava com dois corações. Foi quando me avisaram, antes eu não sabia. Foi uma surpresa que eu tive logo depois do transplante --- revela.
A paixão pelo Corinthians não impediu o aposentado de, logo após a cirurgia e de ter retornado para Garça, ir assistir a uma partida do time do coração em sua cidade natal.
A preocupação era que, devido ao seu estado de saúde, ele pudesse sofrer emoções fortes e, mesmo com dois corações, não agüentar.
--- Depois do transplante eu voltei para Garça e o Corinthians jogou aqui com o Palmeiras e perdeu. Eu assisti o jogo inteiro e não aconteceu nada --- recorda-se aliviado Laerte.
O coração implantado foi doado pelos familiares de um homem de 28 anos que teve morte cerebral ao bater com a cabeça em um acidente.
--- Eu não conheci a família, não tive contato --- conta Laerte, que diz ter ficado obsessivo por exercícios após o drama.
--- Queria provar a mim mesmo que eu estava bom, normal. Eu jogava Tênis de Mesa na minha juventude. Depois, eu fui querer aprender jogar tênis de campo e passei a jogar bastante. Jogava quase todos os dias até que deu um derrame na vista e fiquei com dificuldade de enxergar a bola e eu parei --- conta.
Atualmente, Laerte informa que apenas joga biribol, além de não dispensar uma boa caminhada.
O corintiano conta que nunca perdeu a esperança nos momentos mais difíceis pelos quais passou, pois sempre pensava na esposa e nos seus três filhos - que na época ainda eram crianças.
--- Na época que eu fui fazer o transplante era muito difícil sobreviver, mas eu tinha esperança de sair dessa. Sobreviver há 16 anos é uma surpresa e eu fico emocionado só de falar.